Saturday, July 30, 2011

O CONTO”A PEDRA”


Tudo começou com uma pequena pedra.

No início, ela era pequena, mas o homem, inventor por natureza, pensou o que poderia fazer com uma pequena pedra que, no seu entender, pouca serventia poderia ter… Aos poucos, sempre que via uma levava-a para sua caverna.

Ao longo dos anos foi amontoando tanta pedra que sua caverna ficou sem espaço.

Depois de muito pensar, resolveu fazer com elas uma experiência.

Com terra e água fez uma argamassa e foi colocando pedrinhas, umas por cimo das outras.

Não tinha ideia do que fazer com elas. Por fim, sai-lhe a forma da sua caverna em ponto pequeno, larga por dentro mas com uma pequena abertura.

Resolveu experimentar a dureza da pedra e fez, dentro do buraco, um fogo que deu origem a uma fogueira.

O fogo aqueceu a pedra e uniu-a aos outros elementos.

E com tanto calor resolveu atirar para a fogueira umas pedras maiores

Seu espanto foi tal que chamou os vizinhos que nada sabiam da sua experiência com a pedra e o fogo.

Reparou que poderia adquirir aquecimento para as frias noites de Inverno. As pedras aguentavam bem o calor, naquela casa que ele pensava ter construído. Descobriu o forno que tanto lhe tem servido, ao longo dos anos. Até aos dias de hoje.



Já teve muito mais funções. O tempo não se condoeu com a invenção do primeiro homem que o descobriu.

O homem viu as mil e umas funções que poderia ter a pedra. A seguir e com elas construíram-se utensílios domésticos, como: mesa, cama, banco, adornos, muros de protecção. Embora ainda de forma muito incipiente, começou aí a escultura. Obras ainda hoje visitadas e admiradas.



Mas a pedra é mais do que isso! Ela ajuda-nos na vida, ainda hoje. Sua durabilidade não tem limites. De vez em quando encontram-se objectos e construções feitas há milénios pelos homens que, com engenho e trabalho, deixarão sua obra para os tempos vindouros. Hoje eu faço colecção de brasões que se encontram, imponentes, por essa Europa fora. Mostram, a quem esteja atento ao seu simbolismo, que ali morou alguém, de posição e fortuna, ou simplesmente para glorificar o nome de uma família.



Penso nos artistas que trabalham ou trabalharam a pedra, essencialmente nos primórdios dos artesões. Com as suas mãos ensanguentadas, cobertas por trapos continuavam a dar forma, com o seu pincel, a obras de arte que lhes sobreviveriam, para regalo dos meus olhos.

Admiradora de trabalhos de pedra, tenho que voltar um pouco mais a trás. Sem querer fazer um trabalho exaustivo. Para isso lá estão os peritos que o fazem a nível científico, melhor que eu.

Da minha alma brota uma admiração imensa sobre o trabalho feito em pedra bruta que muitas vezes levava séculos para ser finalizado.



A pedra começou a servir a humanidade como abrigo. A seguir como ferramenta e depois com adorno. Mais tarde, construções megalómanas como as pirâmides e outros monumentos. Como fortalezas para defender senhores feudais e seus povos. Temos como exemplo ainda hoje a muralha da china.

Ao longo dos milénios ela sempre serviu o homem. Hoje ela está na minha vida. Minha casa é de pedra. Meu jardim é de pedra e meus caminhos por onde relaxo ainda são feitos de muros de pedra que noutros tempos, dividiram propriedades, famílias e dentro desses muros, muita gente se alimentava de pequenos rectângulos.



São poucos os vestígios que ainda encontro hoje no meio de altares de cimento e vidro. Cada vez é mais difíil de encontrar um brasão, por exemplo.

Mas qual a importância da pedra para mim?

Nasci em casa de pedra, trabalhei no meio de pedras. Fazia montes de pequenas pedras que se iam acumulando no meu caminho e numa horta onde tinha que passar a água.

Nada mais belo que uma estatua que imortalizou pessoas e famílias. Assim como os brasões, orgulho de quem tinha dinheiro para pagar esse trabalho árduo do artesão. Mas eles aí estão para regalo da nossa visão.

A pedra, elemento natural do planeta. Dentro de nós, humanos, correm vestígios de todos os seres que habitam no mesmo habitat.

Era uma vez uma pedre pequenina que entrou no meu sapato.

Eu incomodada, não quis dar-lhe importância. Aos poucos, á medida que eu andava, ela ia-me mordendo debaixo do meu pé, sensível.

Chegou a um momento. Tive que parar para tirar a pedra que ali se alojou. Qual não foi o meu espanto, ao ver o tamanho reduzido da pedra que mais parecia um grão de areia. Fiquei a matutar naquilo enquanto segui meu caminho.

Essa pequena ferida aos poucos foi infectando. Eu não liguei por pensar ser uma coisa menor. No fim do dia já eu me queixava.

A seguir, comecei a juntar todas as pedrinhas, ate conseguir, construir um jardim. Com elas foi amuralhado, protegido. Aos poucos foi crescendo até que já eram tantas as pedrinhas que resolvi, no jardim, construir um palácio, de pedra todo ornado. Como havia ainda muita pedra, construí uma igreja, a seguir. Resolvi então começar a pensar as muitas coisas que, com elas, poderia fazer. No planeta ela enfeita montanhas, serranias, minas, túneis por onde eu passo. Talhei a mesa, a cama também a mortalha. O tempo passou. Meu legado com as pedras continuou. Hoje detenho-me sempre que vejo pedra trabalhada ou em bruto. Sempre vejo nela utilidade. A pedra pode ser bruta ou um raro diamante. Por ele se mata no mundo. A pedra que tem mais cor, dela tira mais valor. Para mim toda ela é igual. Tal como nós, diferenciam-se pela cor. O homem deu-lhe a sua hierarquia. Entre elas existem as mais caras, as que mais brilham. Homens atiram outros homens para buracos sem fundo á procura da pedra rara. Vão até ao fim do mundo. Homens escravos passam vidas inteiras, envolvidos em poeiras. Morrem cedo, por doenças causadas pela ambição humana, sem nunca se queixarem. Vêm depois os pudicos que negoceiam no ramo. Criam obras de caridade para esconderem o contrabando.

Passeiam-se na passadeira vermelha, vedetas do acaso, com brilhantes presos á orelha, ou á vista da câmara.

Mas a pedra, perante a natureza, é toda igual. Não tem diferença nem cor. Apenas faz parte do mundo dos nossos horrores.

Aqui estou eu numa sala de hospital, apreensiva, com algo que pode estar mal. A pedra vai deixar para trás, com todo o seu encanto. Sempre me pareceu igual.

A meu lado outro ser sofre de ansiedade, por antecipação, por não saber controlar sua emoção.
Por: Joaquina
30/07/2011

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