Monday, July 25, 2011

CONTO EXEMPLO DE VIDA - CASO VERÍDICO



Os tempos mudaram. Todos sabemos isso. Hoje, os pais têm uma grande dor de cabeça quando começam as férias de escola dos filhos. Eu, como habitante de uma grande cidade, já senti isso na pele. Vêm-me à memória os meus tempos de escola e o tempo em que tudo era mais fácil, para todos.

Quando chegavam as férias escolares os pais sempre tinham tarefas para os filhos. Era na horta ensinando-lhes a sobrevivência.



A minha memória leva-me para umas férias de natal onde o tempo dos miúdos era aproveitado para ajudar ao sustento da família.

Era costume, nessas pausas escolares, os pais mandarem os filhos ao rebusco.”Era aproveitar a azeitona que ficava para traz, depois de os donos dos olivais, terem feito a sua apanha.” Os miúdos, de seguida, iam com uma sacola e uma bucha no bolso. E apanhavam a azeitona que ficava entre os ramose a que estava esmagada no chão. Tudo era aproveitado e num dia inteiro, com um pouco de trabalho e vontade, levavam-se para casa, cerca de 2 quilos de azeitona. Meu pai metia essa azeitona dentro de uma saca. No fim das ferias aquela azeitona poderia encher meia saca de azeitona boa (uns 30 quilos). Depois juntava-a á outra nossa azeitona, para fazer azeite para o ano.



Certo dia, andava eu e outra colega de escola na nossa tarefa. Até que se junta a nós um outro grupo de quatro miúdos. A partir daí, esquecemos o trabalho, acendemos uma fogueira, comemos a nossa bucha e logo esquecemos tudo, entrando numa brincadeira de miúdos. Quando demos pelo tempo, ele tinha voado e as sacolas estavam quase vazias. Eu, aflita, disse logo que não poderia aparecer em casa com aquilo. Que o meu pai me iria bater. Comecei a chorar com medo de ir para casa. Logo ali, um rapaz se lembrou que por perto havia um olival com azeitona por apanhar. Fomos todos a correr e enchemos as sacolas. Mas como a mentira tem a perna curta, o facto de encher demais a sacola, deu nas vistas.

Cheguei a casa feliz. Logo meu pai reparou na sacola. Era sempre eu que a despejava a saca. Naquele dia, meu pai reparou que vinha mais cheia do que em outros dias.

- Maria, dá-me a sacola! Logo que olhou para a azeitona soube logo que não era de rebusco.

- onde apanhaste esta azeitona? – Foi no rebusco, retorqui eu. – Não me mintas que eu sei reconhecer que esta azeitona não é do rebusco. Se me disseres a verdade não te bato. Se insistires em mentir vamos ter aqui uma grande chatice. Meus irmãos todos me diziam em voz baixa: - conta a verdade Maria, senão levas uma tareia de cinto. Perante tal apelo e medo da sova, lá contei a verdade ao meu pai. -Muito bem. Agora despeja esta azeitona numa cesta. Quero ver se ela foi toda roubada ou se tens alguma que é fruto do teu trabalho.

Obrigou-me a separar a azeitona. Depois mandou-me pôr a restante, que não nos pertencia, na sacola. -Agora vais comigo a casa do compadre levar a que lhe pertence. Pelo caminho deu-me todos os recados sobre o que era ser um ladrão. Que na minha imaginação eu não teria feito nada de mal, uma vez que todos fizemos o mesmo.

- Não quero saber do que fazem os filhos dos outros! Em minha casa não há ladrões. E tu estás farta de saber que não se deve tirar nada aos outros. Eu argumentava que não voltava a fazer, e que se o tinha feito, o fiz por medo. – Estás enganada Maria. Eu podia ficar um pouco zangado por trazeres pouca azeitona. Mas sabia que era um trabalho honesto, e não passava disso. Agora vais ter que devolve-la e pedir desculpa.

Chegamos e batemos á porta. Lá vem o compadre do meu pai, admirado por nos ver, aos dois.

- Boa noite compadre, diz meu pai. – Entrem! O que o traz por aqui a esta hora? Minha filha vem devolver uma azeitona que apanhou no seu olival. E vem pedir desculpa. – Deixe-se disso compadre. Ela é uma miúda. – Diz lá o que vieste fazer, Maria. – Quero pedir desculpa pelo que fiz e venho devolver a sua azeitona. – Se assim o queres, está bem, respondeu o compadre. Foi despejar a azeitona numa saca e devolveu-me a sacola. Quando ia a sair, disse-me: - não te zangues com tem pai. A isso chama-se educar um filho. Se todos assim fizessem, não haveria ladrões.

Regressei a casa, envergonhada, mas consciente que meu acto não foi correcto. Nunca mais apanhei uma única azeitona que não pudesse levar para casa. Foi sem dúvida uma grande lição. A tal ponto que, passados muitos anos, e já com minha família formada em Lisboa, algo parecido veio a acontecer. Teria minha filha uns 5 anos. Passados 20 anos daquele episódio, dei comigo a ensinar o mesmo á minha filha. O sentido foi igual. O contexto é que foi diferente.



Estávamos numa mercearia a fazer compras e minha filha chega-se a uma bacia de azeitonas curadas, que ali se encontravam para venda. Ela, com sua mão pequenina, tirou umas 5 azeitonas e fechou a mão, escondendo-a por traz das costas. Não vi ela tirar as azeitonas. Mas sabia que tinha na mão escondido algo que tirara sem licença. E pedi: - Filha, mostra o que tens na tua mão.  -Não tenho nada, respondeu-me.  -Se não me mostras, terei que ser eu a abrir-te a mão. E continuou a afirmar não ter nada. Como não mostrava a mão tive que a abri. Quando vi as azeitonas na sua mão, veio-me logo á memória o meu episódio de infância.

- Agora põe as azeitonas no sítio e pede desculpa. Começou a chorar. Logo a dona da mercearia começou a ficar espantada comigo. – Deixe lá isso, não tem importância. Ela é apenas uma criança!

Baixei-me ao nível da minha filha , olhei-a nos olhos e disse-lhe: - minha filha. Nunca se mexe naquilo que não nos pertence. Tu gostavas que uma menina fosse lá casa e te levasse uma das tuas bonecas? – Não, mãe – respondeu ela. -A mãe não está zangada contigo. Só quero que me peças as coisas. Se a mãe tiver dinheiro compra-te. Se não tiver, não compra. Entendeste o que te disse? – sim mãe, respondeu, já aliviada. -Ainda queres azeitonas? – Quero. Se podes comprar. Pedi então 250 gramas de azeitonas. – Toma, são todas para ti. Promete que nunca mais mexes em nada que não te pertença. -Prometo mãe. E obrigada pelas azeitonas. Assistia, atónita, a dona da mercearia áquela conversa, condenando-me pela minha atitude. Disse-lhe apenas que era a minha forma de educar minha filha.



E assim ela se habituou a pedir sempre o que queria. Qualquer coisa. Ao ponto de todos os dias pedir coisas.

Diariamente, quando ia para o infantário, passávamos frente a uma pastelaria. Um dia, quando regressava, disse que não tinha lanchado e que tinha fome. Entrei na pastelaria e comprei-lhe um bolo. A partir desse dia, queria um bolo todos os dias. E disse-lhe: - enquanto pedires bolos eu não tos dou. -Mas eu tenho muita fome! Disse ela, apelando à minha sensibilidade. Então, quando chegarmos a casa, comes sopa.

E passaram uns dias, talvez uma semana, sem pedir nada. Vendo que eu não lhe dava um bolo, puxou pela minha mão e frente á montra diz, de uma forma muito sorrateira: - Mãe, eu já há muito tempo que não peço bolos.

 Meu coração derreteu-se.

-Já percebeste. Se não pedires e a mãe puder comprar, compra-te o bolo. Entramos e disse-lhe: - podes escolher o bolo que quiseres. Resposta daquela criança:  -podes pagar, mãe? -Desta vez posso pagar. E podemos também levar um para o pai? A senhora que estava ao balcão achou tanta piada àquela observação, que acabou por lhe dizer: - escolhe um de cada. E deu-lhe uma caixa com bolos. -Quem paga hoje, sou eu. Perante tal atitude, fiquei um pouco desconcertada. Contei-lhe que a estava a educar para não pedir bolos todos os dias. Ela entendeu. Sempre que entrava na pastelaria dizia: - A tua mãe é que manda!

Foi a melhor lição de vida que dei á minha filha.

A semente que plantei nela deu seus frutos. Hoje, vegetariana, não pode ver um animal abandonado. Já deixou de comer para comprar comida para animais. É ecológica, honesta, e rica de coração. Para mim, uma grande alma ao serviço do Planeta.

Por: Joaquina
23/07/2011

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